É em uma pequena casa no segundo andar, ao lado do Rodoanel de São Paulo, que Isabela Dantas Barbosa, 41 anos, divide seus três cômodos com sua filha Lorena, de 2 anos, e, às vezes, com o neto quando o filho a vem visitar. Conciliar a rotina de trabalhadora doméstica e mãe é uma realidade que muitas mulheres enfrentam para conseguir alimentar e manter seus filhos.
- Não é fácil, mas é por eles - afirma.
Aos 15 anos, Isabela saiu da Paraíba para São Paulo sem conhecer nada do mundo. Deixou a casa de seus avós para morar com seu tio e buscar oportunidades melhores. Mas pela falta de estudos e necessidades financeiras, o único caminho que encontrou foi trabalhar como diarista. Vinte e seis anos depois, ela segue faxinando, sem nunca ter terminado os estudos, mas com a esperança de um dia ainda se formar professora.
Agora mãe, Isabela se vê tendo que deixar a filha sob cuidados de outra pessoa. A rotina, mesmo durante a pandemia, sempre começa às 4h da manhã quando acorda, prepara as coisas do trabalho e cuidadosamente arruma Lorena para deixá-la na vizinha, que mora a duas casas.
As luzes dos postes ainda estão acesas, é tão cedo e ao mesmo tempo tão tarde para pegar a condução até o trabalho. A cidade não para e os transportes públicos permanecem cheios. Uma das suas maiores preocupações ao sair para o emprego é se contaminar e transmitir o vírus para aqueles que ama.
Todo esse esforço a faz lembrar do tempo em que estava grávida. O medo de ser demitida e ficar desamparada a acompanhou até os sete meses de gestação e, quando finalmente contou, foi dispensada. Relembrar os dias em que teve que trabalhar com produtos químicos fortes, subir escadas e pegar peso, faz com que Isabela chore. Ela tenta disfarçar, mas o desespero que sentiu naquela época ainda é evidente em cada palavra que emite.
A ausência de direitos básicos trabalhistas, como férias remuneradas, décimo terceiro salário, licença-maternidade, previstos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), resulta da subvalorização que a profissão enfrenta. E, em meio à crise sanitária, o reconhecimento e a concessão dos direitos ficam ainda mais difíceis.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), de 2020, revelam que aproximadamente 70% das funcionárias não possuem carteira assinada, como é o caso de Isabela. Paradoxalmente, devido ao tempo que exercem o trabalho em um determinado local, os patrões projetam a algumas trabalhadoras a imagem distorcida de uma relação amigável entre contratante e contratada. A diarista diz que tal relação não existe, que a funcionária só possui valor enquanto pode desempenhar as tarefas.
Em meio a uma profissão desvalorizada e à pandemia do novo coronavírus, Isabela se agarra em suas orações e pede a Deus que "a proteja e proteja aqueles que ama". Para amenizar os pensamentos, ela escreve sobre o cotidiano e sua família em um caderno que carrega consigo pelos transportes públicos. "À moda antiga", ela afirma sobre seu passatempo. A escrita, amor e religião são as âncoras que atenuam as dores que sua profissão traz.